O orgulho na cara da Anton Guimerà era evidente e dois motivos explicam isso: o passo importante que o espanhol e a sua equipa de investigadores deram rumo a um melhor entendimento e comunicação com o cérebro; e o facto de esta mesma investigação ter sido capa da consagrada revista científica Nature Materials.
“Estamos a desenvolver interfaces cerebrais baseados em grafeno. Tiramos partido das vantagens do grafeno para produzir sondas mais confortáveis e para gravar sinais do cérebro em frequências muito baixas e que não podem ser registadas por outras tecnologias”, explica-nos o investigador do Instituto de Microeletrónica de Barcelona (IMB-CNM CSIC).
O que Anton e os restantes investigadores conseguiram foi criar uma forma de ouvir os “sussurros” do cérebro, o que aumenta de forma significativa a informação que é possível recolher relativamente à atividade cerebral.
Este avanço abre portas importantes na monitorização de doenças, como a epilepsia, “nas quais as frequências baixas representam um papel importante dentro do cérebro, pois permitem perceber os mecanismos da epilepsia e ter ferramentas para monitorizar esses sinais.”
Por outro lado, diz ainda, permite ter um maior número de locais de registo de atividade cerebral para o mapeamento da produção da fala e isto pode ser importante em pacientes que tiveram acidentes vasculares cerebrais (AVC). Em última instância, ao saber aquilo que o cérebro “pensa”, será depois possível criar um equipamento que ligue esses pensamentos a um assistente digital para que fale por nós.
O que parece a concretização de uma ideia digna de Hollywood é apenas o arranhar da superfície de uma mina de possibilidades que ainda estão por descortinar.
“Há muito trabalho por fazer na ciência básica para perceber os mecanismos do cérebro para codificar a informação. Quando forem conhecidos, é possível perceber que podemos construir tecnologia para descarregar a informação do cérebro, mas tem de se perceber primeiro como esta informação é codificada”, sublinha Anton Guimerà.
Ensinar computadores a pensar como humanos
Se por um lado estão a ser feitos avanços para colocar o cérebro mais em linha com aquilo que é possível fazer num computador, o caminho inverso também está a ser feito. É por isso que desde a década de 1950 se tem tentado ensinar os computadores a comportarem-se mais como o cérebro humano. Só agora, na segunda década do século XXI, é que a inteligência artificial, aquela que põe as máquinas a pensar como humanos, está a mostrar o seu verdadeiro potencial.
Um exemplo: investigadores da DeepMind criaram no final de 2017 um algoritmo de inteligência artificial, o AlphaZero, que aprendeu, sozinho, a jogar três dos jogos de tabuleiro mais complexos que existem – xadrez, shogi e Go. E só precisou de 24 horas para se tornar mestre nestes três desafios.
A empresa Neuralink do milionário Elon Musk está a trabalhar para permitir o carregamento de informação para o cérebro. “Apercebi-me nos anos recentes de que a inteligência artificial vai obviamente passar a inteligência humana em grande medida”, disse. Para Musk, a única forma de não sermos subjugados à vontade das máquinas é fazermos upgrade às nossas capacidades enquanto humanos.
São estes avanços que estão a fazer mover outras peças no xadrez da tecnologia, como a empresa Neuralink, do milionário Elon Musk, que está a trabalhar para permitir o carregamento de informação para o cérebro. Porquê? “Apercebi-me nos anos recentes de que a inteligência artificial vai obviamente passar a inteligência humana em grande medida”, disse o sul-africano em 2017, durante uma entrevista. Para Musk, a única forma de não sermos subjugados à vontade das máquinas é fazermos upgrade às nossas capacidades enquanto humanos.
Uma visão que para Martin Wezowski, designer líder e futurista na tecnológica alemã SAP, não está correta. “Já estamos a assumir que é competição [entre humanos e máquinas]. Isso é uma suposição injusta. Diria que a tecnologia e os humanos estão sempre a viver numa simbiose. Olha para o fogo, inventámos o fogo e começámos a controlá-lo”, exemplificou. O perito tem uma palavra para esta mistura entre humano e máquina que parece inevitável – Humachine. “Não existe o nós contra eles. É nós, ponto final.”
Martin é um crente na infusão de tecnologia no cérebro humano e explica a sua posição com recurso à palavra francesa amour, que significa amor.
“Se vemos que os caminhos neurais se ligam de determinada forma para criar uma memória, como o de uma palavra em francês, que tal fazer essa conexão, mas sem se ter a memória? Basicamente, implantar informação. Com a nanotecnologia ou com outras investigações em que pode influenciar-se o cérebro com luz, pode lá colocar-se informação. Um dia, ao beber um café cheio de nanorrobôs, o que estás a beber é o caminho para a língua francesa.”
Este é um futuro, nas palavras do próprio Martin, “possível”, mas que agora é “imaginário”, é “ficção científica”. O que por si só acaba por não ser um problema, pois sonhar com o que parece impossível é o que faz alguém, como Anton Guimerà, mover as pedras necessárias para criar o caminho até à visão final.
Fonte: DN